Andanças na metrópole

As camadas de história encobertas em construções, ruínas e paisagens

Andanças na metrópole - Vicente Vilardaga
Vicente Vilardaga
Descrição de chapéu refugiados

Na Baixada do Glicério, a esperança dos refugiados

Casa do Migrante da Missão Paz faz 50 anos e atendeu 115 mil pessoas desde 2014

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São Paulo

Na Baixada do Glicério, ponto especialmente deteriorado da cidade, acontece um dos projetos mais antigos e bem-sucedidos para acolhimento de refugiados do país. É a Missão Paz, atrelada à igreja Nossa Senhora da Paz, que tem suas origens em 1939 e surgiu para acolher imigrantes italianos. Ela está sob responsabilidade da congregação dos scalabrinianos.

Depois, em 1974, há 50 anos, foi criada a Casa do Migrante, abrigo que passou a receber refugiados de todas as nacionalidades, primeiro vietnamitas e chilenos, fugidos da guerra e da ditadura de Pinochet, e depois gente do mundo inteiro que busca escapar de conflitos armados e da perseguição política e religiosa em seus países.

Em torno da igreja, recheada de esculturas de Galileo Emendabili e afrescos de Fulvio Pennacchi, se estabeleceu um complexo de acolhida que garante um recomeço digno e seguro para os que chegam no Brasil.

Refugiados
Refugiados fazem atividade no salão da Casa do Migrante: projeto completa 50 anos - Vicente Vilardaga

Os refugiados contam com serviços como aulas de português, programas para inserção no mercado de trabalho com cursos profissionalizantes, atendimento médico e psicológico, assistência social, advogados, além de espaços para socialização e um centro de pesquisas.

À frente da Missão Paz está o padre italiano Paolo Parise, que comanda uma equipe de 40 funcionários. Ele conta que nos últimos dez anos passaram pela Casa do Migrante mais de 115 mil pessoas e só haitianos foram 37 mil de 2010 até hoje.

"Em 2009, com a lei da regularização migratória, passaram aqui 12 mil pessoas para se regularizar, mais de um quarto dos 42 mil que cumpriram o mesmo trâmite no Brasil inteiro.", diz. A Casa do Migrante tem 110 vagas, mas abriga atualmente 83 refugiados de várias nacionalidades, como afegãos, angolanos, venezuelanos, cubanos, congoleses, tunisianos, etíopes e iranianos. Os angolanos são maioria.

Igreja Nossa Senhora da Paz
Igreja Nossa Senhora da Paz: esculturas de Galileo Emendabili e afrescos de Fulvio Pennacchi - Vicente Vilardaga

O Brasil é uma opção inicial para os refugiados, mas não necessariamente um lugar para ficar. "É uma porta de entrada que, na maioria dos casos, serve para alcançar os Estados Unidos e o Canadá, onde os salários são mais altos", afirma Parise. "A grande queixa de quem vem para cá é de não conseguir se manter com o salário, ter que pagar o aluguel e não sobrar mais nada para viver."

Não há uma estatística de quantos vão embora, mas, no caso dos afegãos, o padre estima que 95% deles, depois de passar alguns meses por aqui, se dirijam para a América do Norte.

O perfil dos refugiados é variado. Entre os afegãos predominam os homens, mas também há casais com filhos. Entre os cubanos há homens e mulheres. No grupo dos angolanos percebe-se uma grande quantidade de mulheres com crianças. Os venezuelanos são principalmente homens solteiros.

Quanto à profissão, muitos afegãos, cubanos, venezuelanos e congoleses têm curso superior em seus países, mas não conseguem trabalhar nas suas áreas por falta de validação dos diplomas.

Corredor que conecta a Casa do Migrante à igreja: espaços são arejados, limpos e amplos

Depois do momento de baixa por causa da pandemia, a vinda de refugiados para o Brasil voltou a subir. A diferença é que a pressão sobre a Missão Paz diminuiu porque surgiram novos abrigos em São Paulo e em outras partes do país. "Hoje estamos abaixo do limite de nossa capacidade, o que permite fazer um trabalho melhor", diz o padre. "No auge da migração haitiana chegamos a receber 400 pessoas por noite."

Atualmente, funcionam vários abrigos para refugiados, como a Ação Social Franciscana (Sefras), o Empoderando Refugiadas, a Missão Scalabrini, em Santa Catarina, as casas de passagem Terra Nova e um abrigo especial para os afegãos em Cotia.

Sem proselitismo, a missão se sustenta principalmente com o apoio da Igreja e recebe verbas da Agência da ONU para Refugiados (Acnur), da Fundação Rosa Luxemburgo e do Fundo Brasil. Também são importantes os recursos vindos de doações.

Para Parise, essas contribuições permitem que um trabalho fundamental seja feito, já que a tendência é de o número de conflitos no mundo aumentar, assim como o de refugiados. "Essa é a realidade que infelizmente estamos enfrentando", diz. "Parece que o ser humano não aprendeu nada."

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